O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou um importante precedente no julgamento do Recurso Especial 2.183.860/DF, ao reconhecer a validade da notificação extrajudicial encaminhada por e-mail para constituição em mora do devedor fiduciante em contratos garantidos por alienação fiduciária de bem móvel. 2y5n5e
A decisão, relatada pelo ministro Antonio Carlos Ferreira e proferida pela Segunda Seção da Corte, uniformiza o entendimento sobre a issibilidade de meios eletrônicos como instrumento hábil de comunicação em relações de direito privado, desde que atendidos determinados requisitos de validade.
O caso em questão envolveu uma ação de busca e apreensão ajuizada por instituição financeira contra um devedor inadimplente, cuja mora foi comprovada por meio de notificação enviada ao e-mail indicado pelo devedor no contrato.
A tese central debatida era se essa forma de comunicação seria suficiente para atender à exigência prevista no artigo 2º, parágrafo 2º, do Decreto-Lei 911/69,[1] que trata da constituição em mora para fins de busca e apreensão.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal já havia validado a notificação eletrônica. O entendimento, portanto, foi confirmado pelo STJ, sob o argumento de que, uma vez demonstrado o envio para o e-mail previamente acordado e comprovado o seu recebimento, está cumprida a exigência legal, independentemente da forma tradicional de carta registrada com aviso de recebimento (AR).
O acórdão destacou a evolução do dispositivo legal, cuja redação foi alterada pela Lei 13.043/14, para itir formas alternativas de notificação. A Corte Superior interpretou que a referência à carta registrada com AR é exemplificativa, não excludente, e que pode ser aplicada analogicamente a outros meios que cumpram a mesma finalidade — ou seja, a de dar ciência ao devedor.
Essa interpretação se baseou no princípio da instrumentalidade das formas,[2] reforçada pela jurisprudência já consolidada de que não se exige a do próprio devedor no AR para que a notificação seja válida. Assim, se o e-mail for enviado ao endereço eletrônico fornecido contratualmente e houver prova idônea de seu recebimento pelo devedor, por interpretação analógica, a notificação é eficaz.
A decisão do STJ – que confirmou a posição já firmada no julgamento do Recurso Especial 2.087.485/RS – também rejeitou a necessidade de regulamentação normativa específica para validar esse tipo de notificação.
Segundo o relator, o Judiciário deve acompanhar a realidade digital e aceitar como válidas as formas de prova documental eletrônica, desde que idôneas, verificáveis e consistentes com os princípios de boa-fé objetiva e segurança jurídica.
No caso concreto, a validade da intimação atendeu aos requisitos da jurisprudência diante da previsão expressa no contrato sobre o uso de correio eletrônico como meio de comunicação, Além disso, a entrega da mensagem foi certificada por cartório especializado.
O acórdão reitera que eventual discussão sobre a autenticidade ou validade da notificação eletrônica deve ser resolvida na fase de instrução probatória da própria ação de busca e apreensão.[3]
O recente entendimento firmado pelo STJ representa um grande avanço para as operações de crédito com alienação fiduciária, já que, ao itir a notificação eletrônica com base em critérios objetivos de validade e segurança, a Corte Superior alinha o direito às práticas contemporâneas, eliminando entraves burocráticos e reduzindo custos operacionais para as instituições financeiras.
Trata-se, portanto, de um importante avanço para o setor bancário e financeiro, que poderá ar a incluir nos contratos de alienação fiduciária de bens móveis a possibilidade de intimação via correio eletrônico, bem como dispensar o envio de notificação por intermédio de carta registrada, adotando soluções digitais mais céleres e econômicas, com segurança jurídica reconhecida pelos tribunais superiores.
A possibilidade de notificação via e-mail também afasta as dificuldades frequentemente enfrentadas pelas instituições bancárias para:
- localizar o endereço correto para intimação pessoal do devedor; e
- realizar intimação por hora certa, muito adotada em processos de alienação fiduciária de bens imóveis – mas também aplicável aos de bens móveis – e cuja validade e eficácia são comumente impugnadas pelo devedor fiduciante.
Nossa equipe está à disposição para esclarecer dúvidas sobre o tema.
[1] § 2o A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a constante do referido aviso seja a do próprio destinatário.
[2] Código de Processo Civil: Art. 188. Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.
[3] Código de Processo Civil: Art. 373. O ônus da prova incumbe: (...)
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.