A recente divulgação do Programa Revive pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é uma boa oportunidade para revisitar a Lei nº 14.011/20, de extrema importância para a gestão do patrimônio imobiliário da União e que, promulgada há quase um ano, foi pouco comentada, apesar de seus notáveis resultados de curto prazo. r5d1p
Essa lei introduziu, fundamentalmente, três eixos de inovações ao regime da Lei nº 9.636/98, hoje a principal legislação dedicada ao tema do patrimônio imobiliário federal:
- A facilitação para a remição do foro (consolidação dos domínios útil e direto) de imóveis da União submetidos ao regime enfitêutico;
- A previsão de dispensa de licitação para a contratação do BNDES para realizar estudos e executar planos de desestatização de ativos imobiliários da União (os quais poderão envolver quaisquer modalidades de desestatização itidas em lei, como a venda, permuta, cessão, concessão de direito real de uso ou mesmo a constituição de fundos de investimento imobiliário); e
- A possibilidade de apresentação, por qualquer interessado, de proposta de aquisição de imóveis da União (desde que não inscritos em regime enfitêutico ou em ocupação), mediante requerimento específico à Secretaria do Patrimônio da União (SPU) – pacificando, assim, antigos debates quanto à viabilidade do impulsionamento de processo de alienação de imóvel público por iniciativa do particular interessado em sua utilização.
Especificamente quanto à apresentação de ofertas por interessados, caso o imóvel não disponha de avaliação válida, o requerente poderá providenciar, às suas expensas, avaliação elaborada por avaliador ou empresa especializada. Ainda que a SPU não fique vinculada a conduzir ou concluir os procedimentos licitatórios para a venda do imóvel objeto da proposta, caso a avaliação seja devidamente homologada e subsidie a realização de uma efetiva licitação, o particular que a custeou poderá adquirir o imóvel em condições de igualdade com o vencedor da licitação – ou ser reembolsado pelo custo da avaliação se decidir não exercer seu direito de preferência.
A nova legislação teve por finalidade impulsionar e agilizar a alienação dos imóveis da União, de forma a garantir maior liquidez ao seu patrimônio e dinamizar o uso desses ativos como estratégia de gestão pública.
As medidas vêm em hora conveniente. Estima-se que a União seja proprietária de mais de 750 mil imóveis – muitos dos quais fruto de execuções de dívidas tributárias federais e da apreensão e confisco de bens adquiridos com recursos oriundos de práticas criminosas. Tamanho contingente invariavelmente constitui relevante fardo ao Orçamento Federal, demandando gastos com a manutenção, fiscalização e segurança dos imóveis – muito embora eles não sirvam necessariamente a qualquer propósito específico para a istração ou ao interesse público de forma mais ampla.
As alterações legislativas já trazem resultados positivos. Se, ao longo de 2020, foram alienados cerca de 60 imóveis da União, desde a promulgação da Lei nº 14.011/20, 192 imóveis já foram objeto dessa nova modalidade de proposta direta de aquisição e deverão ir a leilão em breve.
Nessa tendência, o BNDES prepara-se para assumir um papel ativo no aumento da eficiência da gestão do patrimônio imobiliário da União. Há alguns meses, o banco anunciou a celebração de convênio de cooperação técnica com a Força Aérea Brasileira (FAB), tendo por objeto o planejamento de projetos de estruturação imobiliária que possam não só racionalizar as despesas imobiliárias do Comando da Aeronáutica, mas também gerar receitas complementares à FAB, trazendo maior eficiência e economicidade à istração do seu patrimônio.
Faz parte desse movimento o Programa Revive, recentemente divulgado. Iniciativa do Ministério do Turismo em parceria com o Ministério da Economia de Portugal, o programa desenvolvido pelo BNDES destina-se à recuperação do patrimônio histórico federal com o apoio do setor privado. Para sua viabilidade, o banco pretende estruturar planos de concessão de bens culturais. Ação semelhante já transferiu, em terras lusitanas, aproximadamente duas dezenas de imóveis à gestão privada, permitindo a mobilização de ao menos 150 milhões de euros em investimentos nas edificações concedidas. É um estímulo, sem dúvida, muito significativo para a preservação do patrimônio histórico e cultural, mas também para a economia do turismo.
Espera-se que, mantida a atual tendência, a Lei nº 14.011/20 e a série de iniciativas dela decorrentes reduzam o gigantesco portfólio atualmente istrado pela SPU, destravem o enorme potencial socioeconômico e cultural contido no patrimônio imobiliário do governo federal e viabilizem concretamente a utilização de imóveis e terrenos altamente atrativos para o aproveitamento de novos empreendimentos no país, nas áreas imobiliária, turística e até mesmo de infraestrutura – como a construção de terminais portuários ou outras instalações com vocação logística multimodal – servindo como um valioso instrumento para atrair investimentos e impulsionar o desenvolvimento nacional.